terça-feira, 24 de abril de 2012

30 de janeiro de 2012 - Campo Grande MS / Brasil

                Sinceramente, sempre achei que matar alguém seria algo que me consumiria por remorso. Só que absolutamente nada havia mudado. Sentia-se calmo, tranquilo e confesso ate um pouco aliviado. Passa pela minha cabeça porque o fato de ter matado mais de um ser humano não me incomodava e porque de ter sido atacado por eles. Me convenci que precisava de um tempo para a realidade cair.
                Enterrei o corpo no quintal mesmo como quem enterra m saco de lixo. Quando terminei, tomei um banho e percebi que a madrugada estava caminhando ao fim. Me troquei e resolvi ir à casa de meu amigo Andrei, mesmo sabendo que ele, com certeza, não iria gostar de ser acordado.
                Andrei era um amigo acompanhava desde a adolescência. Com toda certeza o meu melhor amigo, um irmão que me ajudava sempre, pelo qual confiava minha vida. Sabia que se houvesse alguém que eu pudesse contar o que houve seria para Andrei.
                Meu medo ainda batia em minha mente. Peguei uma faca de combate que tinha como lembrança da época de serviço militar, coloquei coleira no meu cachorro e fui ate meu carro que havia abandonado horas antes. Caminhava lento e prestando atenção em cada espaço que alguém pudesse se esconder e qualquer movimento diferente de Toram, meu cão.
                Meu carro estava com o vidro quebrado, a chave no chão perto do corpo, como havia deixado.
                 - Toram, pra dentro – gritei colocando o cachorro, enquanto limpava os vidros do banco do motorista.
                Sai dirigindo, meu bairro continuava sem ninguém nas ruas, o acidente agora estava rodeado com policiais e socorrista. Passei como se aquilo não existisse.
                Andrei morava em um prédio na Afonso Pena, perto do Shopping. Conforme ia me aproximando do centro da cidade o movimento ia aumentando. Vi algumas pessoas correndo e alguns corpos estavam jogados pelas calçadas. Parei o carro na rua, desci com Toran e fui entrando e subindo as escadas, ate ver um corpo com um facão enfiado no peito.
                Mais alguns andares e estava na frente do apartamento de meu velho amigo. O corredor estava sujo de sangue e meu corpo gelou. Abri a porta com medo do que viria. Felizmente vi meu amigo de pé em frente à janela olhando o amanhecer.
                - Incrível te ver de pé assim há essas horas – disse aliviado – Que foi, caiu da cama?
                - O amanhecer é uma das obras mais incríveis, aos meus olhos – disse Andrei ainda de costas – Esperava você Bastian! Ou posso chama-lo de Avirus, o caçador. Estou confuso de como me referir a você.
                Estranhamente Toran correu animado ate Andrei, abanando o rabo e sentou-se aos pés dele.
                - Como é que é? Mané, você ta bem? – perguntei me aproximando – to precisando falar contigo.
                Toran mostrava-se feliz e tranquilo aos pés de Andrei. Eles sempre se deram bem, mais nunca havia visto Toran tão sociável e animado em ver alguém. Abaixado acariciando meu cachorro Andrei disse:
                - Também  precisava encontrar voce. Imaginei que viria aqui depois do que fez.
                - Você esta falando de que?
                - Você não procurava seu amigo pra contar das mortes que causou aos seus irmãos?
                - Como você sabe disso?
                - Vejo o que você faz há tempos! Só estou nesse mundo pra isso. Só estou nesse mundo por sua causa.
                - Hein? Do que você esta falando?
                Olhando para mim, percebi que Andrei esta diferente, um olhar agressivo, mais imponente que me dava frio na alma.
                - Sou aquele, escolhido e desci do reino dos céus para caçar o caçador. Eu vim para livrar o mundo de você!
                Ao terminar a frase correu para cima de mim, me acertando com um soco atordoante. Sem entender, só me afastei e gritei.
                - Você está louco Andrei? O que esta acontecendo?
                - Eu não sou Andrei, meu nome é Ciel! Leve esse nome aos seus senhores do inferno.
                Seus ataques continuavam e doíam terrivelmente. Já havia levado socos demais naquela noite, mas nenhum deixava a sensação de queimadura. Minha paciência foi acabando e resolvi revidar aos golpes.
                A luta era violenta e ambos atacavam com toda ira que seus corpos podiam gerar. O apartamento estava sendo destruído. Mesas, espelhos, vasos, tudo era usado como arma. Em certa altura da luta, que não percebi qual, perdi a noção e já não via pensava mais no que estava fazendo.
                Em um desses ataques, senti uma cadeira sendo quebrada em meu peito e a queda foi inevitável e incrivelmente dolorosa. Rapidamente, Ciel, subiu em cima de mim e começou a me estrangular. Sentia sua mãe queimando meu pescoço. Em um movimento de reflexo, saquei minha faca, e enfiei entre as costelas do infeliz que me largou em um pulo.
                Com a faca ainda encravada na lateral do tórax disse:
                - Demônio tolo – Armas humanas matam apenas humanos.
                Tentando, tonto, me levantar, em uma velocidade sobre humana ele cruzou a sala e parou na minha frente me prendendo na parede com a mão direita no meu pescoço, me levantando do chão.
                - Oras, você se tornou quase humano – dizia me estrangulando – perdeu suas habilidades demoníacas inúteis.
                O ar começava a faltar.
                - Vocês demônios ainda se atrevem a questionar e enfrentar as decisões dos céus. Ainda insistem em corromper as almas livres dos homens. Você é fraco, ignorante e desleixado como todo demônio.
                As dores eram insuportáveis  e aumentavam junto com minha raiva. Sentia a consciência indo embora, quando algo em meu corpo esquentava e minha raiva estourou.
                - Seu fim será primeiro que de todos! –disse Ciel – volte ao inferno em nome...
                - Foi mal velho, - eu disse colocando a mão nas laterais da cabeça dele – Eu sou ateu!
                Sentia minha mão esquentar, mas agora, não doía. Agora era prazeroso, e com isso me sentia como novo.
                Ciel apertava ainda mais meu pescoço, agora com as duas mãos, mas quanto mais força usava mais sentia meu minha mão quente, mas força sentia em minhas mãos e menos dores sentia. Já não sentia mais a falta do ar. Sentia agora algo correndo pelo meu braço, pelas minhas mãos e entrando na cabeça do que foi meu amigo. Agora gritando com dores, seus ataques eram apenas pra livrar sua cabeça das minhas mãos. Vi seus olhos perderem lentamente o branco e uma sobra preta tomava conta.
                Ajuda! – disse Ciel apontando a Toram.
                Meu cachorro que ate agora assistia tudo sentando quieto, agora mordia meu braço com uma violência que não imaginei que teria. Apenas com um movimento de braço, joguei o cão para longe, enquanto mantinha minha mão esquerda ainda sobre meu inimigo, que se retorcia.
                Sem saber o que estava fazendo apontei minha mão a Toram, que vinha novamente em ataque, senti minha a palma da minha mão queimar outra vez. Toram agora parado, como se estivesse sido hipnotizado, mostrava-se submisso a mim e seus olhos também perderam o branco, sobrando apenas um olhar negro, profundo e focado.
                Voltando minha atenção a Ciel disse:
                - Ao contrario de você, não vou te mandar de volta a lugar algum. Daqui você não sairá. Sua existência acaba aqui – Gritei enquanto transferia toda minha raiva para Ciel.
                Ele gritou de agonia. De sua boca se fez uma luz forte que durou alguns segundos, ate Andrei cair morte e livre de Ciel.
                Senti-me aliviado e feliz pela morte de Ciel, porem ver Andrei, morto sangrando pela boca me revoltou.
                A sombra que se fazia em uma das paredes da casa, agora tomava forma e dela surgiu um homem, de terno negro, gravata vermelha, muito bem alinhado, alto e forte.
                - Bem vindo de volta Avirus, aquele que já foi o meu melhor caçador!

Bastian S. Barros