domingo, 4 de março de 2012

30 de janeiro de 2012 - Campo Grande MS / Brasil

Cheguei ao saguão do prédio. Um silêncio obscuro ocupa o ambiente. Caminho até a porta de entrada, de vidro, no qual se encontra trancada.

- Porcaria... Só da pra abrir com o interfone de algum apartamento. HEY! TEM ALGUÉM AI? MAURÍCIO! TA AÍ?

Mas onde esse Maurício foi parar?! O cara é o porteiro! Deveria estar na guarita logo em frente a porta. Mas o silêncio continua. Bem.. no chaveiro da minha moto, tenho o controle do portão. Vou ter que sair por lá mesmo. Volto ao elevador e aperto o botão S1, que me leva ao primeiro subsolo do estacionamento. Caminho até minha moto parada na vaga. Preta, quase se camufla na pouca iluminação do ambiente. Algumas lâmpadas incandescentes tentam dar alguma luz. ( Não consigo deixar de pensar do porque ainda usarem lâmpadas incandescentes nos dias de hoje em um prédio desses... Ossos do ofício mesmo).

Sento no banco macio e confortável da minha Shadow e dou a partida. O motor de 600 cilindradas da uma tremida e começa a trabalhar. O escapamento, não mais o original, mas um maior e com um ronco mais grosso e firme, dá vida ao lugar. Dou uma leve acelerada pra me acalmar e percebo uma mancha vermelha no tanque da moto. O sangue da minha camiseta começa a pingar. Merda.

Acelero e saio pelo o portão do prédio. A avenida Afonso Pena está incrivelmente deserta! nada! nenhuma pessoa ou veículo em movimento!

- Mas o que está havendo nesta cidade??? Nem mesmo o ponto de ônibus em frente ao shopping tem alguém. Caramba.. to ficando realmente preocupado.

Vou seguindo com a Shadow em direção ao centro. Chegando perto da rua Paraíba, percebo uma pequena aglomeração de pessoas na calçada. Todas agachadas, em uma espécie de circulo. Paro a moto próximo a eles e a deixo ligada, apenas no neutro. Tiro o capacete e o seguro em uma das mãos.

- Hey vocês aí! Podem me dizer o que está havendo?

Todos olham imediatamente em minha direção, surpresos por me verem ali. "Por acaso eles não ouviram o barulho da minha moto chegando?!"

- Mas que porra é essa na sua mão??? - Pergunto a uma mulher, que segura algo parecendo com uma perna humana. A roupa dela e dos demais e até os rostos, estão cobertos de sangue. Olho melhor e percebo um corpo caído próximo ao grupo...  sem uma das pernas..

- Mas que diabos?! - Tremendo e sem reação, tento caminhar até a moto. Mas eles são mais rápidos e saltam em minha direção. Antes que eu pudesse fazer algo, um cara me segura pelo o pescoço e me ergue do chão, apertando muito forte. Quase sem ar, lutando pra respirar, percebo que outros dois deles seguram cada um em um braço meu e começam a puxar no sentido oposto com muita força.

- Ahrngg.. tento gritar, mas já quase sem voz..

Percebo um sorriso sádico no rosto do enforcador. E quando penso que já não vou mais aguentar, algo estranho acontece. O cara afrouxa a mão e me solta repentinamente, incluindo os outros dois. Caio no chão e respiro fortemente, ainda atordoado e com a visão turva. Tento, ao mesmo tempo, perceber o que está havendo, mas a única coisa que vejo são corpos caindo no chão à minha frente. Em seguida, percebo um vulto se afastando..

- Volte.. me ajude.. eu... E acabo desmaiando...



Abro os olhos e uma luz natural e tranquila repousa sobre eles. Mecho minhas mãos e meus pés e percebo que está tudo em ordem. Me levanto devagar e olho ao redor. Estou num quarto. Sentado sobre uma cama macia, de coucha branca de algodão. As paredes com um tom bem súave em branco, assim como todos os móveis. Tudo era tão branco que por um momento, me senti tonto. Já não estou mais sujo de sangue e minha roupa é outra. Uma espécie de túnica grega feita de lã, também branca. Me levanto totalmente da cama e caminho até a porta. Abro-a com certo receio e saio.

Um lindo vale se estende à minha vista. Minha mente por um momento trava naquela imagem e meus pensamentos se perdem, desaparecem, dando espaço àquela vista magnífica. Dois riachos passam paralelamente sobre o vale e um bosque se estende ao longo de sua margem acima.

- Que bom que acordou, Omael. - Uma voz surgiu ao meu lado.

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Roberto Medeiros